Captação de recursos e elaboração de projetos pelo Marco Lógico
Metodologia possui rigor científico para a elaboração, execução, monitoramento e avaliação de projetos sociais
Já sabemos que não basta somente boa vontade, idealismo e amor a uma causa para que se consiga captar recursos e elaborar projetos sociais. As iniciativas informais, mesmo que bem intencionadas, são insuficientes. Muitos projetos não obtêm financiamento por apresentarem objetivos pouco claros, sem coerência lógica com as atividades ou em número excessivo, além de falta de elementos para avaliação entre vários outros tipos de problemas.
Sem a necessidade de sofisticados métodos matemáticos, o Marco Lógico (Logical Framework Approach – LFA, na sigla em inglês) é uma metodologia com rigor científico para a elaboração, execução, monitoramento e avaliação de projetos sociais. Foi criado em 1969 pela empresa de consultoria Practical Concepts Inc., especificamente por Leo Rossenberg e Lawrence Posner, a partir de um contrato com a Agência para o Desenvolvimento Internacional dos Estados Unidos (Usaid).
No começo dos anos 80, a empresa de consultoria Team Technologies, dirigida por Moses Thompson, incorporou – a pedido da GTZ (Agência Alemã de Cooperação Técnica) – novos elementos de análise ao Marco Lógico.
Desde então, tornou-se a metodologia utilizada pelas principais agências internacionais, como o Bird, BID, bem como por praticamente todas as agências da ONU, como OIT, Pnud, OMS e FAO, e da União Européia.
O que é?
Resumidamente, podemos dizer que o Marco Lógico é dividido em quatro partes.
Primeira: Momento de gestação do projeto. Aqui são propostos os vários níveis de complexidade e a estrutura geral. É feita a identificação do projeto e o estudo dos problemas que levaram à constituição do mesmo. Nessa fase também é realizado um conjunto de análises que identificam e priorizam os problemas e as possíveis alternativas de solução. A partir do Enfoque do Marco Lógico (EML) um projeto deve primeiro ter as suas bases estabelecidas e identificadas. Para isso, propõe os seguintes pontos de análise: antecedentes e experiência, análise da participação, análise do problema, análise dos objetivos, identificação dos grupos-meta, análise da estratégia.
Segunda: Com os fundamentos estruturados, causas e efeitos do projeto identificados, a próxima etapa da metodologia visa redigir o projeto propriamente dito. Para esse fim, utiliza uma matriz, geralmente chamada de Matriz 4x4, que de maneira lógica e eficaz aborda todos os principais componentes necessários para que um projeto tenha sucesso. Articula entre si e com rigor, de maneira clara e funcional, o objetivo de desenvolvimento (objetivo geral), os objetivos do projeto (objetivos específicos), os resultados esperados, as atividades, as hipóteses e pré-condições (situações externas que podem facilitar ou dificultar o projeto), os indicadores de resultado e as fontes de verificação.
Matriz do Marco Lógico:
Objetivo de Desenvolvimento Indicadores de resultado Fontes de verificação Hipóteses e pré-condições
Objetivos do projeto x x x
Resultados esperados x x x
Atividades x x x
A segunda fase planifica as operações de um modo preciso, com todos os recursos necessários para a sua efetividade. É também nesse momento que são quantificados e estabelecidos orçamento, plano de trabalho e cronograma de execução.
Terceira: A execução do projeto é a ação prática daquilo que foi pensado e redigido nas duas primeiras fases. Durante toda a execução, realiza-se o monitoramento, e nesse momento é possível que alguns caminhos sejam alterados, caso não estejam satisfazendo o cumprimento das metas.
Quarta: A avaliação final passa a ser, a bem da verdade, um coroamento e conclusão de todas as avaliações parciais (monitoramentos). Ambos tornam-se possíveis na medida em que todas as fases do projeto apresentam indicadores e fontes de verificação.
Outros pontos fundamentais no EML são: planejamento participativo do projeto, abordagem na questão de gênero e redação sob o critério Smart.
Planejamento participativo
Erroneamente, as metodologias tradicionais não incluem o planejamento participativo em seu processo de planificação. Ele é importante não só por uma questão de democracia, transparência e respeito a todos os envolvidos diretos e indiretos no projeto, mas também porque é essencial para a eficiência e obtenção de melhores resultados.
Todos os atores envolvidos terão um compromisso muito maior a partir do momento que tiverem a sua participação garantida. A situação que permite um índice adequado de participação possibilita um controle melhor de tudo o que ocorre, além de decisões de maior qualidade.
É claro que nem todos os atores possuem o mesmo nível de participação. Há aqueles que somente participam das informações sobre o projeto. Em um segundo nível, os atores já emitem opiniões, e o nível mais alto é o da tomada de decisões. Entretanto, deve ser garantido espaço a todos, seja à população referida, às organizações governamentais e privadas, ao público local, entre outros. Ou seja, o planejamento não é monopólio de um só ator. Todos participam.
Questão de gênero
Por óbvio, nenhum projeto social pode ser contra os direitos humanos, de justiça e democracia. São pré-requisitos que garantem um projeto justo e sustentável. Lutar pela eqüidade de gênero é lutar por uma eqüidade de toda a sociedade. Como os projetos normalmente são destinados a uma população referida neutra, a tendência é que o preconceito contra a mulher seja encoberto e, assim, a iniqüidade continua. Dessa forma, estabeleceu-se que mesmo se o projeto não tiver as mulheres diretamente como escopo, não deve perder a perspectiva e referência das questões pertinentes ao tema em todas as suas fases.
Critério Smart
Tanto no momento em que se pensa o projeto como durante sua redação recomenda-se a utilização do critério Smart. Esse termo é uma abreviação do inglês que significa:
• Specific (específico): Não devemos esperar resolver todos os problemas do mundo. Se fizermos isso, acabaremos não resolvendo nada, inclusive a situação específica que desejamos mudar.
• Measurable (mensurável): Tudo o que se pretende atingir deve necessariamente poder ser medido. Para isso, temos os indicadores e as fontes de verificação.
• Acceptable (aceitável): Um projeto não pode estar em contradição, por exemplo, com a comunidade próxima à população referida. O que seria resolver um problema e criar outro.
• Realistic (realista): Expressa de maneira realista o que se pode realizar, considerando as hipóteses e pré-condições.
• Time-bound (limite no tempo): indica o prazo em que se deve cumprir o objetivo.
O Marco Lógico, por fim, é uma das principais metodologias de uso internacional para que as ONGs passem a se profissionalizar e a racionalizar a elaboração de projetos sociais, atingindo nível de detalhamento e excelência que nada fica a dever a outros tipos de projetos.
Eduardo Magalhães (magaedu@uol.com.br)
Sociólogo, professor e consultor para o Terceiro Setor.
Revista Filantropia nº 27 - janeiro/fevereiro
*Sustentabilidade* se refere ao conjunto de ações que permitem - a um grupo, uma comunidade, um movimento, uma organização, um projeto ou programa - se desenvolverem com segurança, com justiça, com equidade, com efetividade, com respeito a todos os seres vivos da rede planetária - garantindo a continuidade dos efeitos dessas ações após o término de seu ciclo-de-vida. Facilitamos aqui experiência e criatividade na busca conjunta de soluções inovadoras e sustentáveis.
sábado, 12 de julho de 2008
quinta-feira, 10 de julho de 2008
Sustentabilidade e Comunicação de Marketing
Sustentabilidade e Comunicação de Marketing
Por Álvaro Esteves*
A palavra sustentabilidade está correndo sério perigo de se tornar tão "irritante" quanto parceria, sinergia, paradigma, focado, qualidade e muitas outras que se desgastaram com o uso excessivo, nos últimos anos. Ela é hoje bola da vez como "mantra" no universo das empresas. As razões são óbvias. Estamos vivendo de fato um momento extremamente crítico na nossa civilização, tanto sob o ponto de vista de ameaças ambientais quanto de inadiáveis questões sociais, e é ampla a difusão dessas informações entre as pessoas que compõem o universo corporativo. O que é muito triste, neste caso, é que a palavra sustentabilidade está sendo usada, muitas vezes, de forma bastante indevida. Pior: em muitas situações em que o entusiasmo (em querer fazer alguma coisa) se mistura ao desconhecimento, seu uso pode soar como oportunista para ouvidos cada vez mais severos com este tipo de tema, no "outro lado do balcão".
O fato é que a sustentabilidade está por trás de uma mudança urgente que todas as organizações precisam empreender ou aprofundar. Trata-se de sair de um modelo linear para um modelo circular na produção e na lógica dos negócios. Precisamos, sim, abandonar um sistema tipo "pega- faz-descarta", em que a seqüência - linear - é extrair recursos da terra, transformá-los em produtos para serem entregues a consumidores no menor tempo possível, descarregando os refugos que o sistema gera de volta à natureza, seja no ar, no solo, ou nas águas.
Quando se fala em sustentabilidade está se falando em uma alternativa de sistema que poderíamos denominar de "pega emprestado-usa-devolve", em que a seqüência é circular e envolve a utilização de matérias-primas, energia e processos de produção benignos, que continuamente recirculam materiais aproveitáveis como insumo para outros ciclos produtivos, ou então os devolvem à natureza, devidamente regenerados, onde possam ser nutrientes de outros processos vitais. Está também implícita, no modelo circular, a necessidade de se levar em conta, além desta visão ambiental, os impactos sociais de cada etapa das atividades produtivas, até o seu consumo e seu descarte.
Quando dirigimos este mesmo olhar para o universo da Comunicação de Marketing, enxergamos também a necessidade de grandes mudanças na lógica predominante. Precisamos igualmente rever nosso atávico modelo linear: criação da mensagem - produção da mensagem (nem sempre sustentável) - veiculação da mensagem (broadcast ou direta) - ação do consumidor. A figura abaixo tenta ilustrar uma possibilidade de alinhamento deste processo a um modelo circular, que talvez possamos, enfim, começar a associar à palavra sustentabilidade:
Nessa visão, temos oportunidades em todo o caminho. Primeiro na criação da mensagem. Não vemos aqui um cerceamento à criatividade nem a necessidade de se ter uma comunicação xiita ou "babaca". Muito ao contrário, vemos, sim, muitas oportunidades de se pensar "fora da caixa", certos de que, para diferenciar um produto de seu concorrente não é necessário apelar para situações preconceituosas ou estimular comportamentos não sustentáveis.
As sempre infindáveis possibilidades do processo criativo podem gerar idéias e situações que tragam alguma contribuição positiva, sem deixar de atender a suas finalidades. As marcas vão agradecer, logo, logo. Um relatório do PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) sintetiza: "A sociedade, agora, tem uma nova escala de preocupações; e as empresas passam a ter necessidade de um novo tipo de mensagens".
Depois, há os processos de produção. No lado do cinema publicitário, há "n" chances de alinhamento: elenco, locações, postura diante do uso de energia, materiais cenográficos e de consumo recicláveis, etc. No lado gráfico, idêntico raciocínio com relação a papel, energia, brindes com caráter social ou ambiental, comércio justo, etc. O mesmo se aplica às mídias, assumindo estas uma postura de respeito ao meio ambiente e ao consumidor, trazendo ainda contribuições ao tecido social onde atua.
Um último aspecto é o relacionado com os canais de diálogo não só com o consumidor, mas também com outros públicos afetados pelos produtos e pelas ações de comunicação. A nosso ver, esta é a porta da inovação da qual tanto carecemos. As organizações fechadas na zona de conforto de seu sucesso imediato precisam - e muito - ouvir continuamente esses públicos de forma a desenvolver seu senso de propósito, sua habilidade de aprender e sua capacidade de responder a mudanças. Em suma, aquilo que garantirá sua competitividade ao longo do tempo. A comunicação de marketing, a serviço deste objetivo e com o novo olhar de que falamos, poderá então usar o termo "sustentável" livremente, tendo o respeito e o reconhecimento de todos.
* Álvaro Esteves é diretor da Ekobé - Sustentabilidade e Responsabilidade Corporativa e autor dos livros "Uma Questão de Tempo" (Ed. Objetiva) e "O Gerente Animador" (Ed. Livro Técnico).
(Envolverde/Instituto Ethos)
09/07/2008
Por Álvaro Esteves*
A palavra sustentabilidade está correndo sério perigo de se tornar tão "irritante" quanto parceria, sinergia, paradigma, focado, qualidade e muitas outras que se desgastaram com o uso excessivo, nos últimos anos. Ela é hoje bola da vez como "mantra" no universo das empresas. As razões são óbvias. Estamos vivendo de fato um momento extremamente crítico na nossa civilização, tanto sob o ponto de vista de ameaças ambientais quanto de inadiáveis questões sociais, e é ampla a difusão dessas informações entre as pessoas que compõem o universo corporativo. O que é muito triste, neste caso, é que a palavra sustentabilidade está sendo usada, muitas vezes, de forma bastante indevida. Pior: em muitas situações em que o entusiasmo (em querer fazer alguma coisa) se mistura ao desconhecimento, seu uso pode soar como oportunista para ouvidos cada vez mais severos com este tipo de tema, no "outro lado do balcão".
O fato é que a sustentabilidade está por trás de uma mudança urgente que todas as organizações precisam empreender ou aprofundar. Trata-se de sair de um modelo linear para um modelo circular na produção e na lógica dos negócios. Precisamos, sim, abandonar um sistema tipo "pega- faz-descarta", em que a seqüência - linear - é extrair recursos da terra, transformá-los em produtos para serem entregues a consumidores no menor tempo possível, descarregando os refugos que o sistema gera de volta à natureza, seja no ar, no solo, ou nas águas.
Quando se fala em sustentabilidade está se falando em uma alternativa de sistema que poderíamos denominar de "pega emprestado-usa-devolve", em que a seqüência é circular e envolve a utilização de matérias-primas, energia e processos de produção benignos, que continuamente recirculam materiais aproveitáveis como insumo para outros ciclos produtivos, ou então os devolvem à natureza, devidamente regenerados, onde possam ser nutrientes de outros processos vitais. Está também implícita, no modelo circular, a necessidade de se levar em conta, além desta visão ambiental, os impactos sociais de cada etapa das atividades produtivas, até o seu consumo e seu descarte.
Quando dirigimos este mesmo olhar para o universo da Comunicação de Marketing, enxergamos também a necessidade de grandes mudanças na lógica predominante. Precisamos igualmente rever nosso atávico modelo linear: criação da mensagem - produção da mensagem (nem sempre sustentável) - veiculação da mensagem (broadcast ou direta) - ação do consumidor. A figura abaixo tenta ilustrar uma possibilidade de alinhamento deste processo a um modelo circular, que talvez possamos, enfim, começar a associar à palavra sustentabilidade:
Nessa visão, temos oportunidades em todo o caminho. Primeiro na criação da mensagem. Não vemos aqui um cerceamento à criatividade nem a necessidade de se ter uma comunicação xiita ou "babaca". Muito ao contrário, vemos, sim, muitas oportunidades de se pensar "fora da caixa", certos de que, para diferenciar um produto de seu concorrente não é necessário apelar para situações preconceituosas ou estimular comportamentos não sustentáveis.
As sempre infindáveis possibilidades do processo criativo podem gerar idéias e situações que tragam alguma contribuição positiva, sem deixar de atender a suas finalidades. As marcas vão agradecer, logo, logo. Um relatório do PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) sintetiza: "A sociedade, agora, tem uma nova escala de preocupações; e as empresas passam a ter necessidade de um novo tipo de mensagens".
Depois, há os processos de produção. No lado do cinema publicitário, há "n" chances de alinhamento: elenco, locações, postura diante do uso de energia, materiais cenográficos e de consumo recicláveis, etc. No lado gráfico, idêntico raciocínio com relação a papel, energia, brindes com caráter social ou ambiental, comércio justo, etc. O mesmo se aplica às mídias, assumindo estas uma postura de respeito ao meio ambiente e ao consumidor, trazendo ainda contribuições ao tecido social onde atua.
Um último aspecto é o relacionado com os canais de diálogo não só com o consumidor, mas também com outros públicos afetados pelos produtos e pelas ações de comunicação. A nosso ver, esta é a porta da inovação da qual tanto carecemos. As organizações fechadas na zona de conforto de seu sucesso imediato precisam - e muito - ouvir continuamente esses públicos de forma a desenvolver seu senso de propósito, sua habilidade de aprender e sua capacidade de responder a mudanças. Em suma, aquilo que garantirá sua competitividade ao longo do tempo. A comunicação de marketing, a serviço deste objetivo e com o novo olhar de que falamos, poderá então usar o termo "sustentável" livremente, tendo o respeito e o reconhecimento de todos.
* Álvaro Esteves é diretor da Ekobé - Sustentabilidade e Responsabilidade Corporativa e autor dos livros "Uma Questão de Tempo" (Ed. Objetiva) e "O Gerente Animador" (Ed. Livro Técnico).
(Envolverde/Instituto Ethos)
09/07/2008
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