sábado, 19 de dezembro de 2009

Os Movimentos de Salvacao (Augusto de Franco)

OS MOVIMENTOS DE SALVAÇÃO QUE QUEREM SALVAR-NOS DE NÓS MESMOS

Tempo estimado de leitura: 17 minutos

‘Carta Rede Social’, ex-‘Carta Capital Social’ (e antiga ‘Carta DLIS’) é uma comunicação pessoal de Augusto de Franco enviada quinzenalmente, desde 2001, para milhares de agentes de desenvolvimento e outras pessoas interessadas no assunto, do Brasil e de alguns países de língua portuguesa e espanhola. A presente 'Carta Rede Social 204' está sendo encaminhada para cerca de 10 mil destinatários.

Augusto De Franco

No último mês – em meio à numerosíssimas atividades – cometi cerca de 350 tuitadas. Quero destacar agora algumas poucas dezenas, relacionadas à #Cop15 – a 15ª Conferência das Partes, realizada pela UNFCCC, Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima,– em curso neste momento em Copenhague.

Há uma espécie de consenso na chamada sociedade civil mundial sobre o tema. Mais do que um consenso. O que há é quase uma unanimidade, reforçada pelos grandes meios de comunicação e outras mídias, ditas sociais, sobre a importância do evento.

Não podemos saber ainda – posto que o encontro só termina amanhã – o que resultará de todo esse esforço. Alguns afirmam, com certa razão, que os resultados, sejam quais forem, já foram positivos. O mundo teria tomado consciência, numa escala jamais vista, da gravidade da situação do planeta diante das mudanças climáticas. Mas minha posição sobre o assunto é um pouco diferente da corrente.

Segundo o sugestivo resumo do site Planeta Sustentável, a COP-15 responde a uma “enorme expectativa por diversos governos, ONGs, empresas e pessoas interessadas em saber como o mundo vai resolver a ameaça do aquecimento global à sobrevivência da civilização humana”.

Pelo visto, e assim o tema vem sendo tratado, trata-se então da reunião mais importante já feita pela humanidade. Sim, pois o site esclarece em seguida:

“Não é exagero. De acordo com o 4º relatório do IPCC – Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, órgão que reúne os mais renomados cientistas especializados em clima do mundo, – publicado em 2007, a temperatura da Terra não pode aumentar mais do que 2º C, em relação à era pré-industrial, até o final deste século, ou as alterações climáticas sairão completamente do controle.

Para frear o avanço da temperatura, é necessário reduzir a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera, já que são eles os responsáveis por reter mais calor na superfície terrestre. O ideal é que a quantidade de carbono não ultrapassasse os 350ppm, no entanto, já estamos em 387ppm e esse número cresce 2ppm por ano.

Diminuir a emissão de gases de efeito estufa implica modificações profundas no modelo de desenvolvimento econômico e social de cada país, com a redução do uso de combustíveis fósseis, a opção por matrizes energéticas mais limpas e renováveis, o fim do desmatamento e da devastação florestale a mudança de nossos hábitos de consumo e estilos de vida. Por isso, até agora, os governos têm se mostrado bem menos dispostos a reduzir suasemissões de carbono do que deveriam.

No entanto, se os países não se comprometerem a mudar de atitude, o cenário pode ser desesperador. Correremos um sério risco de ver:
=> a floresta amazônica transformada em savana
=> rios com menor vazão e sem peixes;
=> uma redução global drástica da produção de alimentos, que já está ocorrendo;
=> o derretimento irreversível de geleiras;
=> o aumento da elevação do nível do mar, que faria desaparecer cidades costeiras;
=> a migração em massa de populações em regiões destruídas pelos eventos climáticos; e
=> o aumento de doenças tropicais como dengue e malária.”
A última parte do texto explicativo tem como título: “COP-15: É agora ou nunca!”


MEU PONTO DE VISTA SOBRE MOVIMENTOS DE SALVAÇÃO

"Devemos ser salvos de todas as salvações
que querem salvar-nos de nós mesmos".
Hakim Bey


Meu ponto de vista não entra na controvérsia científica sobre o peso das emissões humanas de CO2 nas emissões totais do planeta para causar os efeitos catastróficos anunciados. Não trabalho com a “ciência do clima” (se é que se possa dizer que exista uma ciência sobre o assunto).

Meu ponto de vista é o da sustentabilidade da sociedade humana – não do atual padrão civilizatório –, que depende, por certo, da sustentabilidade, vamos dizer assim, bio-física (bio-química incluída, além, é claro, da dimensão biológica) dos ecossistemas, porém vai muito além disso ao fazer a pergunta-chave: o que queremos mesmo sustentar?

Parto do pressuposto de que tudo que é sustentável tem o padrão de rede. E, se estou preocupado com a rede social que constitui a sociedade humana (posto que o ecossistema planetário, de um jeito ou de outro, arrumará um jeito de se autoregular em novos patamares de estabilidade), estou principalmente preocupado com o que construímos e achamos que vale a pena manter.

No livro “Tudo que é sustentável tem o padrão de rede” (2008), já havia comentado algumas incoerências do reducionismo ambientalista ao responder por que não devemos reduzir a sustentabilidade à sua dimensão ambiental. Perdoe-me a auto-citação:

“Ao contrário do que muitos acreditam, o conceito de sustentabilidade não se aplica somente ao mundo natural, aos diversos ecossistemas terrestres e ao ecossistema planetário. A palavra sustentabilidade ficou identificada com o ambientalismo, porquanto foi estudando os sistemas naturais que percebemos, pela primeira vez, a incrível capacidade de conservação da adaptação e da organização que caracteriza os seres vivos, sejam eles organismos, partes de organismos ou ecossistemas. Nos últimos vinte anos, entretanto, percebemos que a sustentabilidade não é apenas uma dimensão ambiental (no sentido do meio ambiente natural) do desenvolvimento e sim o novo nome do próprio desenvolvimento sob uma perspectiva sistêmica, englobando todas as suas outras dimensões, inclusive a social.

Percebemos que a chamada “teia da vida” é uma estrutura capaz de regular as mudanças de modo a contribuir para a sustentabilidade, não porque é um sistema biológico e sim por ser um sistema complexo adaptativo, organizado em rede. Ou seja, começamos a perceber a existência de relações intrínsecas entre os padrões de organização em rede e os processos de sustentabilidade. Percebemos ainda, no tocante às sociedades e às organizações humanas, a existência de um nexo entre as mudanças sociais que interpretamos como desenvolvimento, as redes como padrão de organização e a democracia como modo de regulação de conflitos. A democracia começou, então, a ser compreendida como uma espécie de “metabolismo” próprio de redes sociais distribuídas.

Assim, quando a sustentabilidade emerge como o grande tema contemporâneo, não é apenas em razão dos perigos iminentes que ameaçam nossa sobrevivência como espécie ― como o aquecimento global ―, causados, em parte, pela falta de preservação ou de conservação dos recursos naturais. O desafio da conquista da sustentabilidade entra na pauta das sociedades como uma espécie de síntese de outros desafios relacionados com os padrões de organização e de convivência social. Sociedades só se transformarão em comunidades sustentáveis à medida que seus padrões de organização e de convivência social forem capazes de constituir ambientes favoráveis ao desenvolvimento humano e social, o que depende ― não há como negarmos ― da maneira como as pessoas interagem e de como regulam seus conflitos. De sorte que, hoje, já podemos afirmar que a sustentabilidade das sociedades humanas é o novo nome do desenvolvimento, uma característica do padrão dinâmico de rede e, ao mesmo tempo, um dos efeitos do processo de democratização. Tal compreensão, todavia, ainda está muito pouco difundida...”

No mesmo texto prossegui argumentando nessa linha, respondendo a questão: por que não devemos dirigir todas as nossas preocupações com a sustentabilidade para “salvar o planeta”?

“Quando falam de sustentabilidade, freqüentemente, as pessoas se esquecem de especificar a que sustentabilidade estão se referindo. Seria a do planeta (e aí nos dá vontade de fazer uma provocação: por que não a do sistema solar, a da galáxia ou a do quadrante em que nos situamos neste universo)? Se não for essa, seria, então, a da vida na Terra ou a da biosfera? Ou será que nossa preocupação é com a sustentabilidade do ser humano como espécie? Mas não seria mais pertinente... nos preocuparmos com a sustentabilidade das sociedades humanas, e, por conseqüência, das organizações que a compõem...?

Ainda que os padrões (ou os mecanismos ou os processos) de sustentabilidade possam ser semelhantes, os desafios são diferentes, dependendo do âmbito a que nos referimos. E misturar as coisas, achando que organizações serão sustentáveis caso se dediquem à proteção do meio ambiente (natural), não ajuda muito. Tudo indica que tal providência não é suficiente: uma empresa pode trabalhar o quanto quiser em prol da conservação ambiental, mas nem por isso terá garantida a sua sustentabilidade organizacional. E é duvidoso que suas ações possam contribuir para salvar a vida na Terra. É mais fácil que o planeta se canse de nos salvar, como, aliás, ele tem feito, há milhões de anos...

O planeta vivo ― Gaia, na hipótese dos cientistas James Lovelock e Lynn Margulis ― tem uma capacidade incrível de conservar sua adaptação e sua estrutura básica. “A vida ou a biosfera regula ou mantém o clima e a composição atmosférica em um nível ideal para si mesma”: essa é a hipótese Gaia. O problema, como argumenta Lovelock (1991), é que uma parte de Gaia, composta pelo “restante da criação... moverá inconscientemente a própria Terra para um novo estado, um estado no qual nós, seres humanos, poderemos não mais ser bem-vindos”.

Lovelock não está preocupado com a vida em geral, que permanece protegida (dentro de certos limites temporais) por um eficiente mecanismo auto-regulador, e sim com a vida humana. Essa, sim, corre sério risco de desaparecimento; não por más, mas por boas razões do ponto de vista do sistema vivo global: se os seres humanos forem sacrificados por Gaia, o serão por efeito colateral de um processo que visa, sobretudo, garantir a vida na Terra.

Não estamos obrigados a aceitar os juízos políticos que Lovelock deriva dessa espécie de determinismo biológico fatal. Em um prefácio de 2004, ao livro Gaia: medicine for an ailing planet, ele faz um apelo a todos os ambientalistas para que:

“Ponham de lado os seus temores sem fundamento [por exemplo, em relação ao progresso científico-técnico na sintetização de alimentos ou na utilização da energia nuclear] e a sua obsessão exclusiva em relação aos direitos humanos [e essa é uma conclusão, digamos, pelo menos temerária, em um tipo de civilização como a que vivemos]... Sejamos corajosos o bastante ― exorta Lovelock ― para reconhecer que a verdadeira ameaça provém dos danos que causamos ao ser vivo que é a Terra, da qual fazemos parte, e que é realmente o nosso lar”.

Sim, mas essa não é a única “verdadeira ameaça”: estamos diante de várias outras ameaças, que não podem ser consideradas como não tão verdadeiras.”

Sim, a vida é um valor principal. Mas não o único. Continuei argumentando para mostrar por que não devemos avaliar que o que está em risco é apenas a vida como realidade biológica.

“Lovelock endossa as palavras do seu cientista-chefe, Sir David King, que declarou, no início de 2004, nos Estados Unidos, “que o aquecimento global é uma ameaça maior do que o terrorismo”. Talvez até seja, mas isso não pode desviar nossa atenção das ameaças à democracia e ao desenvolvimento humano e social sustentável, que são tão verdadeiras e tão presentes quanto a ameaça do aquecimento do planeta.

Não é uma questão de comparar riscos. É claro que o desaparecimento da espécie humana anulará todas as preocupações humanas. Mas, de certo modo, algum dia, nossa espécie desaparecerá mesmo: pelo menos neste planeta, com a extinção do nosso Sol que deixará de ser uma estrela amarela daqui a aproximadamente 5 bilhões de anos; ou nesta galáxia, que está marcada para morrer (como já sabemos, nossa Via-Láctea está em rota de colisão com a galáxia de Andrômeda, a 125 quilômetros por segundo e o desastre ocorrerá nos próximos 10 bilhões de anos); ou neste universo, com “Big Crunch”.

Ocorre que, por meio do que chamamos de social, estamos construindo um mundo humano, que tem como base o mundo natural, mas que não é conseqüência do mundo natural. A tentativa humana de humanizar o mundo ou, para usar uma expressão poética, de humanizar a “alma do mundo” por meio do social, é uma espécie de segunda criação. Para quem pensa assim, a vida é um valor principal, mas não o único: certos padrões de convivência social, além da vida (biológica) ― como a cooperação ampliada socialmente ou a vida em comunidade, as redes voluntárias de participação cidadã e a democracia na base da sociedade e do cotidiano do cidadão ― também constituem um valor inegociável, quer dizer, um valor que não pode ser trocado pelo primeiro.

Vamos caricaturar um pouco uma hipotética situação de escolha para mostrar o sentido do argumento. Se alguém nos dissesse que, para continuar existindo como espécie, nós, os seres humanos, nunca mais poderíamos materializar, em nossa convivência social, a cooperação, o voluntariado, as redes e a democracia, a troca valeria a pena? Quem de nós poderia aceitar tal trade off, condenando nossa espécie a viver, por exemplo, não apenas mil anos, mas, digamos, um milhão de anos ou mais, naquele III Reich com que sonhavam Hitler e seus colaboradores sociopatas e psicopatas?

Em outras palavras, não podemos esquecer tudo isso para agora nos dedicarmos somente a tentar retardar o desaparecimento biológico da espécie. Não vale ser salvo da destruição para viver em um mundo desumanizante.

Isso não significa que agora devemos descurar das ameaças ambientais. Mas se nossa preocupação é com a sustentabilidade das organizações humanas que fazem parte da sociedade... os fatores propriamente humanos e sociais devem ter um peso tão decisivo quanto (ou até mais decisivo que) os fatores naturais (ambientais), não?

Surpreendentemente, aquilo que devemos preservar é, justamente, o que pode nos preservar como sociedade tipicamente humana. Cooperação, voluntariado, redes e democracia (em suma, tudo o que produz, relaciona-se ou constitui o chamado capital social) são os elementos da nova criação humana ― e humanizante ― do mundo, que lograram se configurar como padrões de convivência social, que vale realmente a pena preservar. E são esses os elementos que podem garantir a sustentabilidade das sociedades humanas e das organizações que a compõem.

Eis a razão pela qual a sustentabilidade das sociedades humanas não pode ser alcançada apenas com a adoção de princípios ecológicos (como querem os defensores ambientalistas ou ecologistas da sustentabilidade), porque, no caso das sociedades, trata-se de um outro mundo (humano-social) que tem como base o mundo natural, mas que não é conseqüência dele.

E vale a pena repetir: a vida é um valor principal, mas não o único. Os padrões de convivência social, além da vida (biológica), também constituem um valor inegociável, quer dizer, um valor que não pode ser trocado pelo primeiro.

Assim, do ponto de vista da sustentabilidade global ― do meio ambiente natural planetário e das sociedades humanas ― desenvolvimento humano e social e democracia parecem ser tão importantes quanto ecologia”.

Para concluir a citação – na verdade uma extensa transcrição – escrevi em outra passagem:

“Os que se dedicam a tratar do tema da sustentabilidade, quer do ponto de vista do ambientalismo ou da ecologia, quer do ponto de vista da responsabilidade corporativa, esquecem-se completamente da política [e, por conseguinte, acrescento agora, da democracia]. É como se as mudanças necessárias para a conquista da sustentabilidade pudessem ocorrer independentemente dessa dimensão (política), quem sabe pelo poder intrínseco das boas idéias ou, talvez, pela conversão das almas por meio do proselitismo dos adeptos da nova religião laica da sustentabilidade.

Não é por acaso que nos textos sobre sustentabilidade dos que partem de um ponto de vista exclusivamente ambientalista, não costuma aparecer a palavra democracia. Em suas antevisões da sociedade planetária sustentável do futuro, parece não haver muito lugar para a política democrática. É o caso, por exemplo, do conhecido texto Esboços de uma sociedade planetária sustentável, de Fritjof Capra e Ernest Callenbach. Para seus autores, não é por meio da política que construiremos a tal sociedade do futuro (o paraíso da sustentabilidade na Terra): tudo se arranjará pelo avanço da compreensão do funcionamento dos ecossistemas. Até mesmo “as diferenças ideológicas se dissiparão frente à consciência de que a Terra é o nosso lugar comum, não importando os nossos diferentes antecedentes culturais et coetera”. Ou seja, para esses autores, não é o aprendizado coletivo resultante da experimentação de novas formas de organização e convivência com as diferenças humanas, como resposta aos desafios de conservar a adaptação a um ambiente que muda continuamente, que tornará nossas sociedades mais sustentáveis e sim uma consciência que surgirá pelo conhecimento da natureza e se imporá como novo padrão ético universal. Eis um novo platonismo que, como qualquer platonismo, despreza a política”.

Bem, vamos começar então.


SOBRE O SIGNIFICADO DE MINHAS TUITADAS

1 - Em primeiro lugar vem o questionamento do transformacionismo:

Transformacionismo: essa mania de fazer, fazer, fazer... Como se nosso ativismo primário pudesse substituir as complexas dinâmicas das redes.

Os caras que querem transformar a sociedade: como se sua inteligência individual pudesse se antecipar ou substituir a inteligência coletiva...


2 - E a crítica das saídas únicas e das grandes narrativas totalizantes:

O que as velhas cabeças não entendem é que não há saída se não mudarmos o padrão de organização. E não haverá mais UMA saída, UM caminho...

Não se trata mais de conduzir o povo (as massas) para UM lugar, seguindo UM líder, UMA plataforma, UMA bandeira...

Novas alternativas surgirão (no plural) por emergência: miríades de atores em rede em um mundo glocalizado, múltiplos caminhos.

Parece que, órfãos das velhas utopias igualitaristas, precisamos desesperadamente de uma nova narrativa totalizante...

Queremos nos agarrar a algo que nos dê um sentido qualquer ao invés de construirmos múltiplos sentidos por meio da nossa interação.


3 – Declaro minha posição contrária à atitude catastrofista e ao tratamento ideologizante (religioso) do tema:

Sou a favor de todas as medidas para conservar dinamicamente nossos ecossistemas. Mas não me venham com catastrofismos ambientalistas!

O aquecimento global é a primeira religião (conquanto laica) erigida sobre pressupostos científicos. Qual é o problema?

O problema é que a ciência do clima é complexa, suas conclusões são ainda controversas e o "fiel" não consegue ter acesso a seus princípios.

Uma pessoa comum não consegue entender as divergentes hipóteses científicas sobre o aquecimento. Resta, portanto, crer sem saber = #religiao.


4 - Cito então dois textos importantes sobre o assunto, de David de Ugarte, que vão mais ou menos na mesma linha:

David de Ugarte: "Los orígenes ideológicos del catastrofismo verde" http://vai.la/pK3

David de Ugarte: "Cambio climático: Historia de un Deicidio" http://vai.la/pMC


5 - E cito também um texto que escrevi, em dezembro de 2008, com a colaboração, entre outros, de Humberto Maturana e do Instituto Matriztico, Rodrigo Rocha Loures e Gina Paladino:

Terms of reference regarding sustainability http://vai.la/pZB


6 - Adianto então qual deveria ser, na minha opinião, o referencial conceitual para um tratamento sistêmico da questão:

Na verdade, como diz o Maturana, precisamos encontrar um novo padrão de interação entre antroposfera (eu diria sociosfera) e biosfera.


7 - Acrescento que a solução será glocal, não global:

#cop15 Um modelo que prevê uma centralização como o Climate Leaders Summit não reflete uma sociedade em rede cada vez mais distribuída.

A solução para desequilíbrio causado por intervenções antrópicas será glocal: modelo global centralizado por Estados-nações é anacrônico.

Harmonizar antroposfera (ou melhor, sociosfera) com biosfera é um processo que só pode se realizar a partir do local.


8 - E que é necessário rever as “verdades” do final do século 20:

Hora de rever as "verdades" do final do século 20 (1): O mundo virou uma aldeia global? Não. Está virando miríades de aldeias globais.

Hora de rever as "verdades" do final do século 20 (2): Pensar globalmente e agir localmente? Não. Pensar e agir glocalmente!

As "verdades" do final do século 20 (3): Sustentabilidade é resguardar recursos para as futuras gerações? Não. É fluir com o curso...

Rever as "verdades" do final do século 20 (4): Pobreza é insuficiência de renda? Não. É falta de conexões e atalhos entre clusters.


9 – Argumento que, em uma sociedade-em-rede, não podemos ficar insistindo em soluções centralizadas:

Cada localidade deve ter como horizonte estratégico controlar suas emissões produzindo a energia que consome. Mas é muito mais do que isso...

Controle de emissões, produção de energia (limpa) e sua distribuição devem ser feitas de modo distribuído: não centralizado ou descentralizado.


10 - Critico a forma do COP-15, a idéia de que seu tema deva ser resolvido pelos chamados “líderes mundiais” e a própria idéia de liderança:

O grande objetivo [do COP-15] é mudar a matriz energética e os padrões de produção e consumo ou conseguir mais dinheiro dos ricos?

A África fez birra? A história da ajuda internacional está farta de exemplos de desvios por parte das corruptas elites políticas africanas.

Toda essa discussão em Copenhague ocorre em um modelo antigo de assembléia-arena de confronto de interesses, cercada por grupos de pressão.

O efetivo tratamento das ameaças ambientais (não só as mudanças climáticas) tem que se dar no local. O mundo não existe. O glocal é fractal.

Duas centenas de chefes de Estado não podem mais representar um mundo de milhares de localidades http://migre.me/es2p

Deveríamos estar conectando cidades que implementam soluções mais do que promover megaeventos adversariais na linha Seattle-99

Acho engraçada essa mania de chamar chefes de Estado de líderes mundiais. O escambau! São apenas pessoas eleitas ou que empalmaram o poder.

Aliás, a própria idéia de liderança - via-de-regra como monoliderança - está assentada sobre bases maléficas: anti-sociais e não-humanas.

Sim, existe liderança emergente (mas sempre multi-liderança)... Ninguém pode ser líder para sempre e em todos os assuntos por força do cargo.

Algo mais parecido com um líder (não-imposto) é aquele personagem interpretado por Avner Eisenberg no filme "A Jóia do Nilo" (1985).

Jerônimo (e todos os outros Nant'ans Apaches) eram líderes emergentes. Já Montezuma era apenas um chefe de Estado. Rede ≠ pirâmide.

Todo esforço de exercer voluntariamente liderança é uma tentativa de manipulação do outro (mesmo quando não se tem consciência disso).

A experiência consciente de liderar é instrumentalizadora: usa o outro, faz dele um meio para nossos desígnios, torna-o objeto.


11 - Critico o participacionismo-assembleísta da chamada sociedade civil mundial, ressaltando a incoerência de suas formas de organização:

Sabe-se que tudo que é sustentável tem o padrão de rede. Mas 90% da turma que diz querer sustentabilidade se organiza hierarquicamente...

Mais de 22 mil representantes da nova burocracia associacionista das ONGs foram lá salvar o mundo. Quantas se organizam em rede? Menos de 1%!

" - Ah! Augusto! Qual a importância disto (se organizar em rede)? O importante é que elas (as ong-piramidezinhas) querem nos salvar".

Pois é. Mas tudo que é sustentável tem o padrão de rede. Não vai adiantar cortar 0,X% [das] emissões de CO2 se continuarmos construindo pirâmides.


12 - Afirmo que, conquanto seja correta e oportuna sua colocação, o tema das mudanças climáticas está sendo instrumentalizado:

Há risco para a vida humana, sim, nas mudanças climáticas. Mas o tema está sendo instrumentalizado. Por quem? Eu digo...

O tema das mudanças climáticas está sendo instrumentalizado: a) por políticos em busca de uma grande causa para não sair da ribalta...

O tema das mudanças climáticas está sendo instrumentalizado: b) por burocracias de organismos internacionais que precisam se legitimar.

O tema das mudanças climáticas está sendo instrumentalizado: c) por cientistas que precisam de verbas para continuar empregados.

O tema das mudanças climáticas está sendo instrumentalizado: d) por organizações não-governamentais que precisam de financiamento.


13 - Sustento que a vida social pode estar ameaçada num prazo bem mais curto (do que a vida biológica) em virtude, sobretudo, dos ataques à democracia e aos valores que construímos:

A vida humana propriamente social (naquele sentido que Maturana atribui ao termo 'social') pode estar ameaçada num prazo bem mais curto.

Esses assim chamados "líderes" que ora se reúnem para salvar o planeta são - em boa parte - adversários da democracia em seus países.

Não pode haver desenvolvimento sustentável sem democracia. A ideologia ambientalista está contribuindo para retirar relevância da democracia.

Diante da catástrofe ambiental iminente, todos se igualam "por baixo" em termos políticos. A nova realpolitik nivela ditadores e democratas.


14 - Exemplifico com o primeiro parágrafo de um artigo publicado em 15/12/09 no Wall Street Journal:

B. Stephens no Wall Street Journal, resume o que venho tentando dizer: "Chávez and Ahmadinejad will address the U.N.'s climate summit...

...Say what you will about these two gentlemen — the support for terrorists, the Holocaust denial, the suppression of civil liberties...

...—at least nobody can accuse them of being global warming "deniers".


15 - Insisto, para terminar, na questão central dos valores que construímos e que queremos preservar:

É incrível! Como não estamos percebendo que o catastrofismo destrói as bases de qualquer construção ética?

Se o mundo herdado (biológico) vai se acabar, perdem relevância os valores humanizantes para a construção do mundo almejado (social).

A cooperação, a gratuidade, as relações horizontais, a democracia vão ficando menos importantes do que a "salvação" do substrato biofísico.

Bem, organizados os twetts desse jeito, talvez fique mais fácil entender o que eu queria dizer.

Até a ‘Carta Rede Social 205’ e um abraço do

Augusto de Franco

augusto@augustodefranco.com.br

http://escoladeredes.ning.com


17 de dezembro de 2009.

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